Corrida de cavalos...

14-01-2022

O autor deste texto é João Pereira Coutinho, jornalista.

"Não tenho filhos e tremo só de pensar. Os exemplos que vejo em volta não aconselham temeridades. Hordas de amigos constituem as respetivas proles e, apesar da benesse, não levam vidas descansadas. Pelo contrário: estão invariavelmente mergulhados numa angústia e numa ansiedade de contornos particularmente patológicos.

Percebo porquê.

Há cem ou duzentos anos, a vida dependia do berço, da posição social e da fortuna familiar.

Hoje, não. A criança nasce, não numa família mas numa pista de atletismo, com as barreiras da praxe: jardim-escola aos três, natação aos quatro, lições de piano aos cinco, escola aos seis, um exército de professores, explicadores, educadores e psicólogos, como se a criança fosse um potro de competição.

Eis a ideologia criminosa que se instalou definitivamente nas sociedades modernas: a vida não é para ser vivida - mas construída com sucessos pessoais e profissionais, uns atrás dos outros, em progressão geométrica para o infinito. É preciso o emprego de sonho, a casa de sonho, o maridinho de sonho, os amigos de sonho, as férias de sonho, os restaurantes de sonho.

Não admira que, até 2020, um terço da população mundial esteja a mamar no Prozac. É a velha história da cenoura e do burro: quanto mais temos, mais queremos. Quanto mais queremos, mais desesperamos.

A meritocracia gera uma insatisfação insaciável que acabará por arrasar o mais leve traço de humanidade. O que não deixa de ser uma lástima.

Se as pessoas voltassem a ler os clássicos, sobretudo Montaigne, saberiam que o fim último da vida não é a excelência, mas sim a felicidade!"

Podemos achar que existe algum exagero neste texto de João Pereira Coutinho, mas... será mesmo que há?

Ao olharmos para as crianças e jovens que nos circundam no ambiente escolar e nos apercebermos das "crises de ansiedade" que apresentam tão precocemente, dos pequenitos que desde os primeiros anos de escolarização começam a frequentar as "explicações", dos adolescentes e pré adolescentes que já são clientes assíduos do Pedopsiquiatra... não podemos deixar de concordar com as palavras do jornalista.

É inquestionável que devemos desenvolver nos nossos jovens o envolvimento e empenhamento nas coisas que fazem (sejam da escola ou não). "Dar o melhor de si próprio em cada coisa que faz", é um bom lema de vida e uma porta aberta ao sucesso. Mas temos também que ter a sensibilidade de perceber que a pressão que pomos às suas costas com algumas das exigências que lhes são feitas, "sugam-lhes" a existência...

A incapacidade sentida por muitos em dar resposta a estas exigências, leva-os a resvalar para uma auto imagem de fracasso e a acreditarem que são incompetentes para qualquer desafio da vida.

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